“A Ilha de Santa
Maria no Contexto da Migração Interna”, intervenção de António Teixeira, da
Associação de Marienses e Amigos da Ilha de Santa Maria (AMASM) no 7º Encontro
Cultural da AAIF 13.04.2013
“A ilha de Santa Maria,
como as restantes ilhas açorianas, são bem conhecidas como terras de emigração
além-fronteiras nacionais e de destinos longínquos, particularmente rumo ao
continente americano. Um fenómeno que ao longo dos séculos se processou de modos
diferentes e por razões diversas, como:
- As fomes, causadas por anos de infertilidade agrícola, um factor sempre poderoso para a deslocação das populações e que, segundo Frutuoso, determinou, já em 1579, a saída da primeira leva de emigrantes da ilha de Santa Maria, para o Brasil;
- A pirataria e o corso, por que as nossas ilhas foram duramente fustigadas nos séculos XVI e XVII, causando grande sofrimento às populações indefesas e deslocações dramáticas para países estranhos, como aconteceu, em 1616, quando uma frota de barcos mouros turcos invadiu e saqueou a ilha de Santa Maria durante uma semana e levou 202 pessoas cativas para Argel, onde a maioria morreu;
- A fuga à pobreza, e também ao serviço militar, e a vida dura e sem perspectivas para os jovens açorianos, que na segunda metade do século XIX optaram, muitas vezes, por emigrar clandestinamente nos barcos baleeiros de Nova Inglaterra, onde se fixaram depois de um duro e longo contrato de trabalho a bordo dos veleiros, de que se registam casos muito lembrados, ainda hoje, na ilha de Santa Maria;
- E sobretudo o sonho dourado das terras da América e Canadá, que se processou com grande intensidade nos Açores em meados do século XX e, entre 1955 e 1985, reduziu a quase metade a população da ilha de Santa Maria.
Mas o povo dos Açores,
e este é um aspecto histórico menos conhecido e menos abordado, também migrou
dentro da sua própria Região - duma ilha para outra - por motivos
económico-laborais e de realização pessoal e familiar, à semelhança do que
acontece com a emigração para países estrangeiros.
Distingue-se, porém,
desta por a terra de destino, como ficou claro, se situar dentro dos limites do
próprio Arquipélago e, consequentemente, os problemas de desenraizamento e
readaptação, que também lhe são inerentes, atingirem proporções menores, em
face da maior afinidade social, cultural e afectiva existente entre a terra de
origem e a terra de destino.
Na minha pequena ilha
de Santa Maria, conheci deslocados de todas as ilhas açorianas – só uma pessoa
do Corvo - que para aqui vieram residir. Este fluxo de migrantes açorianos foi
fortemente condicionado por razões de trabalho e colocação profissional, em particular
no «tempo dos americanos» e no apogeu do Aeroporto civil. Santa Maria tornou-se
então como que «eldorado» dos Açores, a «América pequenina», como se dizia, a
tal ponto que, incompreensivelmente e durante um curto período de tempo, chegou
a ser exigido um termo de responsabilidade – a falada «carta de chamada» - dos
residentes para aqueles que pretendiam aqui fixar-se, certamente com o fito de
evitar uma superlotação demográfica julgada incomportável.
Outros profissionais
não ligados aos serviços do Aeroporto procuraram igualmente Santa Maria no
último século, nomeadamente jovens professoras do ensino primário, muitas das
quais casaram nesta ilha, e pescadores da ilha de São Miguel, sobretudo de Vila
Franca do Campo, que encontraram condições de vida mais favoráveis nesta terra,
onde a densidade da população dedicada à pesca teve sempre um nível baixo.
Ainda hoje, os vilafranquenses e os seus descendentes, já de segunda, terceira
e quarta geração, têm uma presença marcante em Santa Maria, com repercussões
não só na actividade piscatória, mas na vida social mariense em geral.
Foi, aliás, esta
realidade que, a par do tradicional intercâmbio de pessoas e bens entre as duas
comunidades, particularmente incrementado por uma ancestral relação comercial
relacionada com o barro e a olaria e, mais recentemente, pela carreira regular
e directa dos «barcos do Parece», justificou a proclamação oficial, em 1984, de
Vila do Porto e Vila Franca do Campo como Vilas Irmãs.
O fenómeno da baleação
– a pesca à baleia, como dizemos nos Açores - que imprimiu uma marca muito
característica à vida social e cultural deste arquipélago, também deslocou para
Santa Maria um número considerável de baleeiros doutras ilhas – na maioria
oficiais e trancadores - muitas vezes com as suas famílias: numa primeira fase,
no final do século XIX, do arquipélago de Cabo Verde e, posteriormente, a
partir de 1937, da Graciosa, Faial, S. Miguel e principalmente das Lajes do
Pico.
Por seu lado, o povo de
Santa Maria também migrou dentro do Arquipélago, possivelmente para todas as
ilhas, mas com maior incidência para as Flores, Faial, Terceira e, de modo
muito especial, para a vizinha ilha de São Miguel, onde hoje reside um notável
contingente de deslocados marienses, nas mais variadas actividades e situações.
Nesta ilha maior dos
Açores, onde vive também um número considerável de migrantes de outras ilhas do
Arquipélago, constitui um fenómeno curioso o espírito de coesão, a
solidariedade e a sociabilidade que se desenvolveu e cimentou entre os
deslocados provenientes da mesma ilha ou grupo geográfico de ilhas,
materializado na criação de associações próprias, com os seus estatutos e
objectivos de natureza sócio-cultural definidos.
Contam-se hoje três
associações de ilha ou de ilhas em S. Miguel, integradas pelos naturais e
amigos das mesmas: a Casa do Triângulo, a Associação Amigos da Ilha das Flores,
que está a celebrar este ano o seu 10.º aniversário, e a Associação de
Marienses e Amigos de Santa Maria (AMASM).
A AMASM foi criada,
formalmente, a 11 de Março de 2011, tendo realizado o seu primeiro evento a 14
de Maio do mesmo ano, com um jantar de apresentação da Associação.
Entre os seus
objectivos figuram, para além da promoção do convívio e união dos marienses e
amigos de Santa Maria que residem em São Miguel, a divulgação da cultura e
história marienses, o incremento do intercâmbio de pessoas e bens entre São
Miguel e Santa Maria e, com especial realce, o fomento do turismo nesta ilha.
É ainda objectivo digno
de destaque da AMASM, e alvo de especial empenhamento da sua Direcção neste
momento, a aquisição e gestão duma residência, em Ponta Delgada, para apoiar
estudantes marienses e doentes deslocados da ilha de Santa Maria oriundos de famílias
carenciadas.
A AMASM visa ainda, no
seu plano de actividades, promover a inscrição de sócios das comunidades ditas
da "saudade", nomeadamente Lisboa e Faro, onde já existem alguns
sócios, e Estados Unidos da América e Canadá.
Entre as actividades desenvolvidas
pela AMASM, conta-se a realização de jantares convívio, muito alargados, com
ementas típicas da ilha de Santa Maria, nomeadamente o já mundialmente
apreciado «caldo de nabos», para angariação de fundos, que garantam a gestão
corrente da Associação e a implementação dos seus objectivos.
Destacamos também a
participação activa que a AMASM teve na "Semana Mariense de 2012",
com encontros sobre diversas temáticas marienses, como a produção da «meloa de
Santa Maria» e a baleação nesta ilha, tendo a associação desenvolvido um papel
fundamental no sucesso desta iniciativa, organizada pela Associação Portas do
Mar, em parceria com a Câmara do Comércio e Indústria de Ponta Delgada.
Podemos, pois, dizer
que a nossa experiência associativa de ilha, nestes dois anos de existência,
foi bastante positiva, pois não só dinamizou o estreitamento das relações entre
os marienses, mas tem contribuído para fortalecer os laços entre as duas ilhas
do oriente açoriano e constituído uma mais-valia para o enriquecimento sócio-cultural
do meio onde vivemos e estamos inseridos” (Arsénio Puim)
Nasceu a 8 de Maio de 1936, na
ilha de Santa Maria, freguesia de Santo Espírito, onde fez os estudos
primários;
Frequentou depois o Seminário de Angra, onde
completou o Curso de Teologia em 1960, tendo exercido a missão de pároco
até 1976, em Santa Maria e São Miguel;
Foi co-fundador do Jornal «O Baluarte de Santa
Maria» em 1977 e seu director até 1982, altura em que se radicou, com a
sua família, em Vila Franca do Campo, onde continua a colaborar no
jornal da sua terra e dá também a sua colaboração ao jornal local «A
Crença»;
Exerceu funções como autarca depois do 25
de Abril, tanto em Vila do Porto como em Vila Franca do Campo, até ao presente;
É autor de três obras sobre a sua ilha natal:
·
«A Pesca à Baleia na
Ilha de Santa Maria» (2001)
·
«O Povo de Santa
Maria - Seu Falar e Suas Vivências» (2008)
·
«As Ribeiras de Santa
Maria - Seus Percursos e História» (2009).
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